Sou um dos felizardos que cresceu
assistindo aos filmes da Disney. Aladdin e Rei
Leão eram o máximo, a nas manhãs Mickey, Donald e Pateta
faziam a minha alegria. O gosto vai mudando com o tempo, mas em nosso
interior fica aquele resquício de vontade de assistir algo parecido, mas
que não seja tão infantil. Pode parecer estranho, e realmente é, mas se você
ler Bone,
de Jeff
Smith, entenderá. Em algum lugar li que Bone é o encontro da Disney
com Senhor
dos anéis. É uma boa comparação se quisermos utilizar poucas palavras
para indicar essa HQ. Na realidade Jeff Smith utiliza toda a sua
experiência conquistada animação e mistura seu fascínio por Carl
Barks
e cria Bone, a obra por qual será lembrado. Seu estilo cartunesco e
traço limpo, nos remetem tanto à Disney quanto à Peanuts, e sua história é
inspirada num mundo de fantasia que pode muito bem lembrar Senhor dos Anéis (bem
antes dos filmes), ou Star Wars com lendas arturianas. No
fim é um exemplar único.
Bone é
um trabalho pessoal e podemos afirmar que muito da personalidade do autor é
colocada nos personagens e na trama, por isso sabemos que Smith é bem humorado
e calmo, não se apressa em contar sua história. Nela reconhecemos muitas
inspirações do autor e percebemos seu toque pessoal em todas elas. Os três
primos Bone foram expulsos do povoado de Boneville devido às más
ações de Phoney Bone, o cidadão mais rico de Boneville. Para tentar
ajudá-lo nesse momento de desamparo o primos Fone Bone é Smiley
Bone
o acompanha (à contra gosto) e acabam se perdendo no enorme deserto. Sem água,
comida ou um mapa decente para voltar, os três acabam acidentalmente se
separando.
Desta forma as aventuras de Fone Bone nos é contada, onde ele se
embrenha na selva, sofre com a chegada da neve acaba interagindo com outros personagens,
como um dragão vermelho, as criaturas ratazanas sempre oferecendo perigo,
segredos do passado sendo revelado à conta-gotas, e o vilão Encapuzado em busca
de Phoney
Bone por motivos que aos poucos vamos descobrindo. Após Fone
Bone conhecer a linda Espinho, e se apaixonar por ela,
outros personagens vão sendo apresentados, como a vovó Bene, forte e conhecedora
dos segredos da floresta. Já no vilarejo que está em polvorosa com o festival
que se aproxima, tendo como ápice a corrida de vacas em que a vovó Bene
participa, como corredora (!), fica explicito o motivo do trambiqueiro Phoney
Bone
sempre estar metido em confusões.
Os três personagens principais tem sua inspiração nos personagens
da Disney:
Fone
Bone é claramente uma referência ao Mickey, e Smiley
Bone
é a própria encarnação Pateta. Mas eles possuem
peculiaridades próprias, que a Disney com certeza não aprovaria em
seus personagens. Smiley fuma um charuto atrás do outro e não pensa em duas vezes
em participar das tramoias de Phoney, esse sim uma mistura do
rabugento Donald com Tio Patinhas, desprovido de
qualidades honrosas e arrogância elevada. Enquanto é Fone que tem a tarefa de
conquistar as pessoas e tirar os primos das confusões, Phoney não mede esforços
em enganar e ser expulso de todos os lugares que frequenta, gerando uma comoção
generalizada. Só para ter uma ideia, Phoney Bone, o outrora habitante
mais rico de Boneville, já construiu um orfanato em cima de um aterro
sanitário. E a razão por ter sido expulso de sua terra natal também é nos
contada mais adiante na história, e Boneville é imaginada pelo leitor da
mesma forma que os ouvintes das histórias dos primos, sempre pelas suas falas e
nunca como uma imagem definida pelo desenhista.
A leitura de Bone é suave, em nenhum
momento cansa o leitor. Com um traço característico de Smith, cartunesco, fica
bem casado com a trama bem humorada e misteriosa. Em muitos momentos me lembrei
de Will
Eisner. Além de várias qualidades, Bone tem os diálogos como o seu
maior desempenho. Jeff Smith consegue impregnar as falas dos personagens com seus
determinados temperamentos e maneiras de pensar. O roteiro é bem cuidado, os
acontecimentos nos surpreendem e os personagens não são bobos, e como Neil
Gaiman e Will Eisner apontam em seus devidos prefácios, o leitor de Bone
está em boas mãos.
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